top of page

Cartas do Daomé: Uma introdução

Luis Nicolau Parés

"A diplomacia africana com as monarquias europeias no período do tráfico de escravos atlântico é um assunto pouco conhecido.
As cartas apresentadas a seguir, porém, nos permitem desvendar aspectos dessas relações internacionais luso-africanas. A série compreende quatorze missivas enviadas pelos reis do Daomé a autoridades portuguesas, entre 1790 e, aproximadamente, 1820. Esse período corresponde aos reinados de Agonglo (1789-1797), Adandozan (1797-1818) e Guezo (1818-1858), e os destinatários foram a rainha d. Maria I de Portugal, o príncipe-regente d. João, e dois dos governadores da Bahia.
Uma parte das cartas cruzou o Atlântico acompanhando quatro embaixadas mandadas pelos monarcas africanos à corte portuguesa: a primeira em 1795, em tempo do rei Agonglo, a segunda e a terceira, em 1805 e 1810, em tempo de Adandozan, e a quarta, por volta de 1820, no 
início do reinado de Guezo. As duas primeiras chegaram a Lisboa, com escalas na Bahia, a terceira, com destino à corte do Rio de Janeiro, ficou retida em Salvador, e da quarta desconhecemos a sorte.
As embaixadas daomeanas foram comentadas por vários autores desde o final do século XIX, mas Pierre Verger, em 1968, na sua monumental obra Fluxo e Refluxo, lhes dedicou um capítulo, transcrevendo, inclusive, nove das missivas supostamente escritas pelos reis Agonglo e Adandozan.
Isaac A. Akinjogbin também usou algumas dessas cartas, e inclusive publicou seu trabalho antes de Verger, mas foi este quem traduziu e lhe passou cópias das mesmas.2 Contudo, os arquivos continuaram a esconder algumas joias. Em 1997, na sua primeira visita ao Brasil, pesquisando no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) no Rio de Janeiro, o historiador John Thornton teve a sorte de achar duas carta do rei Adandozan e uma do rei Guezo. A estas, como a outras duas depositadas no Arquivo Público do Estado da Bahia (APEB), Verger não tivera acesso e, portanto, constituem uma contribuição original para a historiografia.
Como o IHGB não lhe permitiu xerocar os documentos e sua viagem estava prestes a finalizar, Thornton tomou notas, apressadamente, da maior parte daquelas longas cartas. Essas anotações iniciais, e versões preliminares de sua tradução ao inglês, ficaram arquivadas até recentemente, quando em conversa com João José Reis, ambos decidiram
que era chegada a hora de retomar o projeto de publicação. Reis tinha fotografado outra carta do rei Adandozan, depositada no Arquivo Histórico Ultramarino em Lisboa (AHU), e coordenou o levantamento e transcrição detalhada dos documentos restantes na Bahia e no Rio de Janeiro, me encarregando da sua organização e anotação e da escrita
desta introdução..."
bottom of page