Literatura e Poder
na África Lusófona
José Carlos Venâncio
"Existe uma tradição bem enraizada entre os Alemães que é o especial interesse e inclinação pelo que lhes é estranho e lhes vem de fora. A ilustrar esta nossa tendência estão os estudos académicos de etnologia e linguística (histórica) comparada realizados desde os fi ns do século XVIII. Ora, não sei se a tradição referida é mero desejo de nos confi rmarmos a nós mesmos perante um mundo muitas vezes sentido como hostil ou se é um Fernweh condicionado pela geografia e pelo clima da Europa Central e que, como nostalgia de tudo quanto é longínquo e inatingível, constitui como que o reverso do saudosismo português.
De qualquer forma, e já no campo real da ciência, abrigamos desde há muito entre nós as duas disciplinas em causa, a da etnologia (ou antropologia cultural, como se prefere dizer hoje em dia) e a da linguística, ambas enriquecidas também com documentação proveniente dos territórios africanos. E foi nesta perspectiva de tradição e dever histórico, além de preocupações mais prementes e surgindo de considerações da política económica actual, que o Instituto de Tradutores e Intérpretes da Universidade de Heidelberga procurou iniciar, dentro do âmbito dos estudos portugueses, o estudo linguístico, sociológico, político e literário dos países e culturas lusófonas da África e da Ásia, completando, desta maneira, o círculo «CBA» (continental, brasileiro e afro-asiático) do respectivo departamento. Deu iniciação, em 1984, ao curso africano o meu colaborador e colega José Carlos Venâncio, que, sendo um profundo conhecedor do ambiente africano e doutorado em Etnologia pela Universidade de Mogúncia (Mainz), reuniu em si as qualidades que garantem o sucesso científi co e humano de uma nova disciplina. E com relutância e já com saudade que uso o pretérito, porque ele acaba de nos deixar.
Só me resta desejar que o trabalho que ele aqui apresenta, assaz interessante aos olhos de um linguista, tenha o acolhimento que merece por parte dos especialistas da matéria e do público em geral, fazendo votos para que, dentro em breve, tenhamos em mãos uma condigna tradução da obra que, sem dúvida, contribuirá para a expansão do conhecimento das culturas africanas na Europa."
Heidelberga, a 28 de Setembro de 1987.
Hans J. Vermeer
Professor Catedrático da
Universidade de Heidelberga