Edição, introdução e comentários de John Henrik Clarke
Com a assistência de Amy Jacques Garvey
As atividades políticas de Marcus Garvey* na Jamaica
Amy Jacques Garvey
O ano de 1929 foi um dos 365 dias mais marcantes e angustiantes da estadia de Garvey na Jamaica. Esforços sutis, silenciosos e sistemáticos foram feitos para esmagá-lo e destruir seu movimento, quando ele não atendeu às propostas de agentes enviados para suplicar-lhe (para seu próprio bem) que desistisse da luta para mudar a condição das massas negras.
Em julho daquele ano, uma sentença à revelia de G. O. Marke, ex-funcionário do órgão de origem na cidade de Nova York, foi adotada por J. H. Cargill, advogado na Jamaica. ... Sir Fiennes Barrett Lennard, Chefe de Justiça. . . proferiu sentença e ordenou a venda de todos os bens e patrimônios da UNIA. . .
Durante a audiência, o Chefe de Justiça multou Garvey em vinte e cinco libras por não apresentar os livros da sucursal local, pois Garvey não possuía. A UNIA local ganhou o recurso, e o governo teve que reembolsar à filial o preço pago pelo Liberty Hall na venda do leilão, que estava abaixo do valor de mercado. Mas Garvey não recebeu nada por todos os ativos das várias unidades auxiliares vendidas por ordem do presidente do tribunal.
O caso Isaiah Morter estava passando pelos tribunais de Belize, Honduras Britânicas, para a Inglaterra em apelação. O Sr. Morter, um patriota negro, deixou sua propriedade para a UNIA “para redenção africana”. Isso o Escritório Colonial (através do judiciário local) disse ser para “fins ilegais” e, apesar dos milhares de libras gastas com advogados e custas judiciais, o órgão controlador e Garvey nunca receberam o legado. Garvey e o movimento foram despojados financeiramente, mas seu espírito nunca foi abalado; então eles realizaram a sexta convenção internacional na Jamaica, e os delegados anunciaram ao mundo um desafio de que qualquer coisa que os homens mortais fizessem para dificultar a luta, o espírito do garveyismo prevaleceria.
Sentindo a mão poderosa do imperialismo revestido de autoridade legal, Garvey decidiu formar um partido político, afim de mudar as condições. Ele e seus colegas o chamaram de “O Partido Político do Povo”. Em 1929 eles publicaram um Manifesto.
Nas eleições municipais subsequentes, eles conquistaram três cadeiras – uma no Conselho Legislativo. Decidiram agora apresentar doze candidatos, um de cada comité, para as eleições gerais para a Assembleia Legislativa. A seguir estão as propostas de sua plataforma, que foram impressas em notas feitas a mão, também no The Blackman.
Se eleito, farei tudo o que estiver ao meu alcance ... para tornar efetivo o seguinte:
1. Representação ao Parlamento Imperial por um mínimo de autogoverno.
2. Proteção do trabalho nativo.
3. Um salário mínimo para as classes trabalhadoras e operárias da ilha.
4. Uma lei para proteger as classes trabalhadoras e operárias do país de seguro contra acidentes, doença e morte, ocorridos durante o trabalho.
5. Uma lei que obrigue o emprego de pelo menos sessenta por cento da mão de obra nativa em todas as atividades industriais, agrícolas e comerciais exercidas nesta ilha.
6. A expansão e melhoria da cidade, vila ou áreas urbanas sem o ônus ou restrição da propriedade privada.
7. Uma jornada de trabalho de oito horas em toda a Jamaica.
8. Uma lei para incentivar a promoção de indústrias nativas.
9. Reforma agrária.
10. Uma lei para destituir e prender juízes que, com desrespeito à justiça britânica e aos direitos constitucionais, agiram de forma injusta.
11. Uma Universidade e Politécnico da Jamaica.
12. A criação de uma Escola Secundária Pública na capital de cada freguesia, para a oferta gratuita do ensino secundário. Anexado ao referido Ensino Médio para ser uma escola de continuação noturna para facilitar aqueles que desejam estudar à noite, afim de avançar em sua educação.
13. Uma biblioteca pública na capital de cada freguesia.
14. Uma Ópera Nacional, com uma Academia de Música e Arte.
15. Reforma prisional.
16. A melhoria compulsória de áreas urbanas das quais grandes lucros são obtidos em confiança, corporações, negociações e empresas.
17. A nomeação de estenógrafos oficiais do tribunal para tomar notas oficiais de todos os processos judiciais no Supremo Tribunal, Tribunais de Magistrados Residentes e Tribunais de Pequena Sessão da ilha.
18. A criação de um Departamento de Assistência Jurídica para prestar assessoria e proteção às pessoas que não possam se fazer representar e proteger adequadamente nos tribunais.
19. Uma lei para a prisão de qualquer pessoa que por coação ou influência indevida forçaria outra pessoa a votar em qualquer eleição pública contra sua vontade, por obrigação ou emprego ou de outra forma.
20. A concessão aos municípios de Montego Bay e Port Antonio os direitos societários das cidades.
21. Uma lei para autorizar o governo a garantir um empréstimo de três milhões (ou mais) de libras do Governo Imperial, ou de outra forma, para ser usado pelo governo, sob a gestão de um departamento do Diretor de Agricultura no desenvolvimento das Terras da Coroa da ilha, agrícolas e outras, com o objetivo de fornecer emprego para nossa população desempregada excedente e encontrar emprego para jamaicanos retidos no exterior; e que o governo compre os navios que forem necessários de tempos em tempos, para facilitar a comercialização dos produtos colhidos nessas terras da Coroa e, ao mesmo tempo, oferecer convenientemente a outros produtores a oportunidade de enviar e comercializar seus produtos.
22. O embelezamento e a criação do Autódromo de Kingston em um Parque Nacional, semelhante ao Hyde Park em Londres.
23. O estabelecimento pelo governo de um sistema elétrico para fornecer eletricidade barata para os centros em crescimento e prosperidade que forem necessários.
24. Uma lei para estabelecer centros clínicos dos quais enfermeiros treinados sejam enviados para visitar casas em distritos rurais, ensinar e demonstrar métodos sanitários e melhoria de saúde no cuidado do lar e da família.
25. Lei para habilitar as Juntas Paroquiais de cada freguesia a empreender, sob a direcção do Governo Central, a construção de casas sanitárias modelo para o campesinato pelo regime de prestações facilitadas, por um período de dez a vinte anos.
26. Uma lei para evitar a especulação na venda de terras em áreas urbanas e suburbanas em detrimento da expansão da vida familiar saudável para cidadãos de meios moderados – especulação tal como é praticada no baixo St. Andrew por tubarões terrestres sem coração.
Como líder do partido, Garvey falou na Cross Roads Square em 10 de setembro de 1929, apresentou o Manifesto e elaborou todas as reformas propostas. Poucos dias depois, ele foi indiciado no tribunal por uma segunda acusação de desacato perante o mesmo chefe de justiça e dois outros juízes. A base da acusação era a décima prancha do Manifesto. Ele foi considerado culpado e condenado a três meses de prisão e uma multa de cem libras. Ele cumpriu a pena de prisão na prisão de Spanish Town, como um “contravento de primeira classe”.
Ao sair da prisão, ele tinha apenas algumas semanas para fazer campanha e estava sem fundos. Aqui estão alguns pontos que ele criou:
Os trabalhadores devem estar segurados contra doenças e acidentes enquanto empregados. . . A capacidade de ganho dos trabalhadores deve ser aumentada, o que beneficiará todas as classes da sociedade. Desta forma, os trabalhadores poderão gastar mais, ganhando mais. . .
Nenhum incentivo está sendo dado aos nativos para fomentar e promover indústrias. O resultado disso é que a Jamaica cresceu para ser um país de consumidores. Dos nossos subprodutos, da agricultura não produzimos nada. Importamos sapatos, roupas, chapéus etc., quando a maioria dessas coisas poderia ser feita aqui mesmo. As fábricas de conservas e curtumes seriam um grande alento para os lavradores das freguesias do campo, cujos frutos excedentes vão para o lixo, e as peles dos animais pouco ou nada trazem.
Meus oponentes dizem que sou contra pessoas brancas e de pele clara. Não é bem assim. Eu sou contra o sistema de classes aqui, que mantém o pobre em baixo, e os pobres são em sua maioria negros. É natural, portanto, que o interesse deles seja o mais próximo deles e querido do meu coração... Vamos todos trabalhar juntos como companheiros jamaicanos e tocar as mudanças para uma NOVA JAMAICA.
Quando os resultados das eleições foram anunciados, Garvey estava chocado e triste. No entanto, percorreu as paróquias e agradeceu aos que votaram no seu partido. Disse ele:
Meus discursos e declarações foram gravados com a esperança de me mandar de volta para a prisão. . . Você foi coagido a não votar em Garvey, pois ele se tornaria muito poderoso; mas sob o sistema partidário um homem é tão poderoso em uma Legislatura quanto seu partido, que deriva seu poder aos eleitores; e eleitores inteligentes votam não apenas porque gostam dele, mas porque ele está vinculado aos planos de melhoria do partido. . .
Os eleitores atrasaram o relógio do progresso por mais dez anos, mas o sistema partidário está bem estabelecido em suas mentes, e ele virá, certamente virá.
Em carta datada de 1º de fevereiro de 1930, reproduzida no Negro World, A. Wesley Atherton comentava a campanha assim:
Rum e depravação humana bloquearam o caminho de Marcus Garvey. O terrível revés que recebeu nas urnas não se deveu em nenhum sentido à falta de organização. Com os meios limitados de que dispunha, sua campanha não poderia ter sido melhor organizada. Ele perdeu no que era quase uma guerra de rum, uma corrida de dinheiro. Com a isca pendurada diante de seus olhos - o linho vermelho do lucro imundo -, os negros filhos de escravos africanos, nesta era iluminada, renunciaram a seu direito de primogenitura e se permitiram ser contratados por mais cinco anos em condições que sugam seus órgãos vitais até o limite, até o osso. Eles negociaram a felicidade futura de seus filhos e transformaram sua masculinidade em pó. Com o chicote do senhor de escravos ainda estalando em seus ouvidos, eles seguiram a corrente de ouro derretido pelas colinas de St. Andrew para votar contra Marcus Garvey.
Eles o esfaquearam ferozmente pelas costas e, enquanto se recuperava daquele ferimento brutal, ele está diante do tribunal da opinião pública, enfrentando as acusações de seus caluniadores. Aqueles que podem, devem ajudar, e aqueles que entre nós que não podem, devem chorar.
Mas o triste canto fúnebre do Partido Político do Povo, não do garveyismo, não será cantado nesta geração, nem na próxima. Deve sincronizar-se apenas com a passagem do tempo para a eternidade. Ambas as causas são imortais e devem sobreviver a todas as barreiras e imposições humanas e materiais. Marcus Garvey garantiu um nicho mais amplo no hall da fama.
Em outubro de 1929, Garvey foi eleito para o Conselho da Kingston and St. Andrew Corporation, mas tendo que cumprir três meses de prisão pela segunda acusação de desacato, ele foi incapaz de prestar juramento e atuar como conselheiro. Ele pediu licença; foi negado por maioria, mas o advogado da Corporação afirmou que era discricionário. Garvey tomou seu assento ao sair da prisão. Então alguns dos conselheiros manobraram novamente para derrubá-lo, mas finalmente perderam.
Surgindo das táticas dissimuladas usadas para mantê-lo fora do Conselho, um artigo foi escrito no The Blackman no qual foi declarado em parte:
"A Corporação se opõe inteiramente ao bem-estar do país... O governo também está desprovido de decência comum, para não dizer dignidade, e bom senso. É verdade que nossa fé na administração local dos negócios é duramente provada; talvez nós não deveriamos ser, mas nossa confiança no fairplay britânico não é sustentada pelas manifestações que vemos dia a dia...”
Garvey, T. Aikman, o editor, e Coleman Beecher, gerente de circulação, foram levados ao tribunal por difamação sediciosa. Embora Aikman admitisse ter escrito o editorial em questão, e Garvey não o tivesse visto, pois estava viajando pelas localidades, o mesmo Chefe de Justiça absolveu Beecher e se referiu a Aikman como "a ferramenta de Garvey" e o sentenciou a três meses de prisão. A Garvey, disse ele, foi criminalmente responsável, e o sentenciou a seis meses de prisão. Garvey e Aikman apelaram com grande custo, e o recurso foi aceito. Assim terminou a terceira acusação de desacato.
Mais tarde, uma comissão especial foi nomeada para investigar os assuntos da Câmara Municipal. Com base em suas descobertas, esse corpo foi dissolvido.
Incapaz de fazer qualquer coisa pelas localidades, ele não estava no Conselho Legislativo e estando impedido no Conselho Corporativo de ter suas resoluções e colocá-las em prática, Garvey, em junho de 1930, formou a Associação de Trabalhadores e Operários para ver o que o esforço organizado poderia fazer em nome deles.
Ele liderou uma delegação ao Governador, pedindo-lhe que investigasse as condições angustiantes das massas da ilha e usasse sua influência para medidas corretivas. Despreocupadamente, o Governador respondeu que, em sua opinião, não havia “sofrimento incomum”.
O próximo passo de Garvey foi redigir uma petição ao rei, por meio do Escritório Colonial. Ele enviou cópias para membros trabalhistas do Parlamento, outros homens de mentalidade liberal e editores de jornais na Inglaterra. O resultado foi a nomeação de uma Comissão Real para investigar as condições políticas e econômicas das Índias Ocidentais. No final de setembro, ele realizou uma reunião em massa monstruosa em Kingston, nos degraus da Coke Chapel (o fórum ao ar livre) para contar às pessoas as boas novas.
Sr. J. Denniston, tesoureiro da Associação dos Trabalhadores e Operários, presidiu e apresentou Garvey. Ele elogiou o povo por seu bom comportamento durante os tempos de provocação, tensão e miséria e delineou os assuntos a serem levados à atenção dos membros da Comissão Real.
Durante o tempo em que serviu o município, a seguinte é uma das resoluções de maior alcance que ele apresentou. Claro que ele foi derrotado na votação:
Fica resolvido que a Câmara, com o objetivo de realizar melhorias cívicas, principalmente envolvendo melhor abastecimento de água, melhor iluminação, instalação de rede de esgoto adequada, melhorias em áreas de favelas, construção de uma Câmara Municipal, construção de novo Corpo de Bombeiros, implantação de recreação terrenos e todas as obras de magnitude que possam ser necessárias como melhorias dentro da Área Corporativa - abordar o governo com o objetivo de garantir a autoridade necessária para emitir um empréstimo local de quinhentas mil libras, afim de realizar essas melhorias imediatamente.
Particularmente como meio de aliviar o atual e contínuo estado de desemprego e dificuldades entre as pessoas. Fica ainda deliberado que se solicite ao Engenheiro da Cidade a elaboração de planos e estimativas envolvendo os custos gerais de todas essas benfeitorias, para orientação da Câmara em expor ao governo a forma como será gasto o valor solicitado.
Ao falar sobre a moção, ele disse que a Depressão estava sendo sentida nas grandes cidades da Europa, Inglaterra e Estados Unidos da América. Seus estadistas não o ignoraram; na verdade, eles não ousaram. Assim, com iniciativa e planejamento, eles põem em prática medidas para aliviá-las – o auxílio-doença, obras de socorro, alimentação de crianças em idade escolar, pensões de velhice, etc.
A Assembleia Legislativa, em vez de abordar os nossos problemas a este nível, ignora-os e continua a sua política individual estreita de construir pontes, reparar um troço de estrada ou construir um tanque de água. Vamos dar-lhes um exemplo de planejamento sensato e fazer o povo de Kingston e St. Andrew feliz.
Alguns de nós vão perguntar de onde vem o dinheiro. É daqui mesmo da Jamaica. Recentemente li nos jornais que um homem morreu e deixou seiscentas e cinquenta mil libras. Há muitos fazendeiros, comerciantes e homens de negócios que ganharam dinheiro aqui e são ricos; mas vivos ou mortos, eles não fazem nada para beneficiar as pessoas de suas comunidades. Eles não têm espírito nacional; mas poderiam ser solicitados a subscrever um empréstimo para o desenvolvimento, pelo qual pagariam juros. Este ato também aliviaria suas consciências.
Os argumentos opostos eram de que tal planejamento socialista havia perdido uma eleição para o Partido Trabalhista. Não pretendiam assumir grandes responsabilidades, pois mal conseguiam administrar o que tinham em mãos. Colocada em votação, a moção foi perdida. Foi doloroso para Garvey que os legisladores de ambos os Conselhos se recusassem a legislar para uma Jamaica melhor, desde a base; mas ele os advertiu que um dia essas pessoas dóceis se levantariam no poder de sua ira e derrubariam as barreiras que as mantêm — as classes mais baixas —derrotadas.
As reformas políticas e econômicas que ele sugeriu na Jamaica estabeleceram o padrão para todos os outros territórios caribenhos. Ele foi o pioneiro, reformador e profeta.
* Jamaica Journal, junho de 1972.
Próximo título - Parte Cinco - Marcus Garvey em suas Próprias Palavras
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